segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Capítulo 17

No 8º andar Vítor tomou choque ao tentar abrir a porta do apartamento. Tudo indicava que lá dentro tinha algo de elétrico. Antes de que Vítor colocasse as mãos na maçaneta para novamente tentar abrir a porta, ele ouviu a escada perguntar:

– Caro, Vítor, o que está fazendo aqui?

– Estou tentando abrir essa porta, não está vendo? Não consigo porque ela dá choque!

– Não, não me referi ao 8º andar. Refiro-me ao prédio todo. Por que está subindo até o último andar?

Vítor, pensou, pensou, pensou e respondeu:

– Não sei... Eu estou subindo porque... Acho que estou subindo porque não me deixam nem descer e nem ficar parado. Escada, se você não percebeu, em cada andar eu tenho que conversar com alguma coisa ou com alguém, só assim eles me deixam passar para o próximo andar!

– Eu já percebi isso sim, Vítor! Mas qual o seu objetivo ao chegar lá em cima?

– Nenhum! Estou subindo só por subir mesmo...

A escada se sentiu um pouco feliz, afinal ela tentava fazer com que Vítor se esquecesse de que ele estava subindo porque queria pular de lá de cima. O plano dela parecia dar certo e se tudo continuasse como está, Vítor não tentaria suicídio jogando-se do último andar.

– Vamos! – disse a escada - Tente abrir a porta mais uma vez.

E assim fez Vítor! A porta se abriu e ele entrou todo contente. Não conseguiria esperar muito pois estava elétrico, talvez por curiosidade de saber o que viria, talvez pelos choques levados momentos atrás mesmo. Acho que se vocês considerarem a segunda opção a história fica mais engraçada, mas isso vocês são quem decidem, são vocês quem estão imaginando a cena.

– Ai, meu Deus, uma pilha gigante! – exclamou Vítor assustado. – Espere aí... – continuou ele – Eu estou assustado com o que? Já vi de tudo nesse prédio, não vai ser uma pilha com pés e mãos, e aposto que até fala, que vai me pôr medo.

– Isso mesmo, não tenha medo de mim. Sou uma inofensiva pilha, não consigo eletrocutar nem uma formiga já eletrocutada! – confessou a pilha.

– Pobrezinha... – pensou Vítor com dó da pilha. – O que você faz aqui?

– O que eu faço? Eu estou trabalhando. E é com muito orgulho que eu faço isso, sabe porque? Porque eu adoro o que eu faço!

– Que maravilha! Qual é o seu trabalho?

– Meu trabalho é simples. Meu trabalho é testar.

– O que você testa? – quis saber nosso Vítor.
A pilha respondeu orgulhosa:

– Eu testo pessoas!

Vítor olhou para a pilha com os olhos arregalados e antes que ele pudesse falar alguma coisa ela continuou.

– Você está vendo aquela máquina ali? Aliás, qual o seu nome?

Vítor procurando pela máquina na direção que lhe foi apontada respondeu:

– Chamo-me Vítor. Não estou achando a tal máquina, vamos até lá.

– Tudo bem. – disse a pilha.

Foram de encontro à máquina de testar pessoas. Quando já estavam em frente dela a pilha falou:

– Vítor, esta é a minha máquina de testar pessoas. Vou te explicar como ela funciona.

Vítor não disse nada, mas pensou muita coisa, como por exemplo:

– Será que é a intenção dessa pilha me testar? Afinal, pelo que eu sei, eu sou uma pessoa.

A máquina de testar pessoas parecia uma balança, dessas que são encontradas na farmácia. A diferença é que essa máquina tinha um pequeno teto.

– Está vendo – continuou a pilha – aquele negócio ali em cima que parece um teto?

– Estou.

– É lá que eu ponho o lado positivo das pessoas. Já na parte de baixo, aquela onde a pessoa pisa, ponho o lado negativo da pessoa.

Vítor, querendo saber o que poderia acontecer com ele, perguntou:

– Onde é o lado positivo de uma pessoa?

– Na cabeça, costuma está na cabeça!

– Então, a parte negativa está nos pés?

– Exatamente, Vítor. Mas quero que fique bem claro: há exceções! Já tive alguns casos onde a parte positiva estava nos pés e a negativa na cabeça?

– O que você faz com um cidadão desses?

– Faço o meu trabalho, ou seja, viro-o de ponta cabeça. Na marra, mas eu viro! Eles ficam bravos.

– O que você faz com eles depois desse teste?

– Depende. Se forem pessoas boas, eu as guardo porque são pessoas úteis. Se forem pessoas que não prestam, eu jogo fora.

– Gozado, - rio Vítor- de onde eu venho fazemos a mesma coisa com as pilhas!

– E é por isso que vou ter que testar você!

As pernas de Vítor tremeram e veio nele uma grande vontade de ir ao banheiro fazer xixi.

– Nada disso, aqui nem tem banheiro! Pilhas não fazem xixi. Entra logo na minha máquina e não reclama.

Entrou na máquina, teve sorte por sua cabeça ser o seu lado positivo e por isso não ficou pendurado pelos pés.

– Vejo aqui que o seu lado positivo é maior que o negativo. Você é uma pessoa boa.

– Você vai me guardar para sempre aqui nesse seu apartamento?

A pilha riu e explicou:

– Não, não vou te guardar numa estante com várias outras pessoas boas, até porque essa estante não existe. Quando eu disse que eu guardo as pessoas boas me refiro à proteção que eu lhes dou. É uma proteção elétrica, extremamente positiva, que ajuda a afastar as energias negativas.

– Mas, pilha, carga elétrica positiva atrai carga elétrica negativa. E, para completar, afasta outras cargas positivas.

– Não se preocupe, Vítor. Nós pensamos em tudo! As cargas positivas que protegem as pessoas boas são modificadas em laboratório, portanto, atraem as energias positivas e afastam as negativas.

– Carga modificada em laboratório? – estranhou Vítor.

– É, assim como vocês, lá na sua terra, modificam bactérias e outras coisas, aqui a gente consegue modificar cargas elétricas.

Vítor acreditou na história e se sentiu mais forte que de costume. Mas isso não é nenhuma novidade. Sabemos que cargas positivas ao nosso redor nos dão um ar de felicidade inexplicável, sem falar, mas já falando, que o impossível se torna possível.

– Acho que você deve partir! – disse a pilha.

– Você tem razão! Já está na hora de ir embora.

A pilha olhou para o chão, fez beicinho, estava triste e quase chorou.

– Não ligue, Vítor, eu sou uma pilha muito emotiva.

– Tudo bem, eu entendo...

– Vamos, aperte a minha mão.

Vítor aceitou e apertou a mão da pilha levando um razoável choque, mas que deu para assustá-lo.

– Aaaaaahhhh! – gritou na hora que levou o choque.

A pilha deu gargalhadas e mostrou para Vítor aquele velho truque do choque durante o aperto de mão que estava na palma da sua.

Vítor também riu e de bem longe gritou:

– Tchau! Muito obrigado pelo campo de força!

– Não foi nada, Vítor. Continue sempre com grandes energias positivas! Adeus!

Vítor, que já tinha entrado no apartamento contente, saiu dele muito mais contente ainda, devido ao negócio do “ar de felicidade inexplicável”.

– Como foi lá dentro? – quis saber a escada.

– Fantástico! Ganhei até presente!

– E onde está o presente?

– Está comigo, ao meu redor!

– Onde? Não estou vendo! – insistiu a escada.

– Não se faça de tola. Você é a minha consciência, sabe de tudo o que acontece comigo e é a maior responsável por eu ter ganho esse presente.

A escada não disse mais nada, só queria seu mérito reconhecido. Seguiram quietos para o 9º andar.