Enquanto conversavam Vítor tinha subido lentamente as escadas, e já estavam no 1º andar. Vítor avistou uma porta e foi aconselhado a entrar pela escada, ou por sua consciência. A escada esperou em seu lugar de escada como faria qualquer escada. Ele lentamente se aproximou da porta e já não sabia se a chocante cena de sua mulher com outro era real ou se era coisa somente da sua imaginação. Começou a duvidar de seus olhos e ouvidos, enfim começou a duvidar de si mesmo por inteiro depois que conversou com a escada do antigo edifício.
Ao abrir a porta não viu nada e já ia voltando para trás quando escutou:
- Entre no apartamento! – gritava a escada para que Vítor a escutasse.
Ele sem perguntas entrou. Não havia nada no primeiro cômodo, assim como no apartamento inteiro. Ao verificar o último quarto da casa, ele voltou para onde estava a porta e muito bravo com a escada queria tirar satisfações com ela. Quando ia em direção da porta, esta se fechou e não o deixou sair. Isso mesmo... a porta não abria!
- O que é isso? – perguntou para si próprio.
- Nada – uma voz desconhecida lhe respondeu.
- Como nada? A porta se fechou sozinha, uma voz que eu nunca ouvi antes está conversando comigo e você só me responde que não é nada! Por falar em você, quem é vc?
- Eu não sou nada... Bem, explicando melhor, eu sou o nada...
Vítor riu cinicamente como fez das outras vezes:
- Nada? E deixa eu adivinhar, eu sou o único ser humano que teve esse enorme prazer de saber que você existe?
- É eu!! Ops, quero dizer, é nada!! Todo mundo me conhece. As pessoas sempre falam de mim, mas o que eu não gosto é que elas sempre falam “Isso não é nada...” mas na verdade estão falando de mim. Na verdade estão falando assim “Isso é nada..” ou “Isso não é alguma coisa...”. Você entende o que eu quero dizer?
- Acho que sim... mas sabe de uma coisa? Eu sempre achei que você não existisse! É uma grande mentirosa a pessoa que responde a alguma pergunta com a palavra nada. Tudo é alguma coisa, é impossível alguém ter o nada nas mãos, porque ninguém sabe o que é o nada.
- Eu existo sim como você já percebeu. Só que ninguém sabe como eu sou e como você mesmo disse, ninguém sabe o que eu sou. Acho que sou um enigma eterno.
- Enigma eterno?
- É, as pessoas não se importam comigo, falam de mim todos os dias e nem se importam se eu existo ou não!
- Então me diga como você é?
- Esse é o enigma eterno, as pessoas não sabem como eu sou.
- Você sabe como você mesmo é?
- Sei sim...
- Então me diga como você é, eu prometo não contar pra ninguém lá fora. Até porque se eu contasse alguém me colocaria num hospício! Pode confiar em mim.
- Está bem... Eu conto, mas você tem que me dizer antes como me imagina!
- Apesar de não acreditar na sua existência, eu sempre te imaginei como um lugar onde não houvesse nada, somente um lugar escuro. Posso comparar com o espaço mas sem os planetas, é lógico. E assim que eu te imagino!
- Tudo bem... mas se você me imagina assim não está me imaginando. Você não está imaginando o nada, você está apenas imaginando um lugar escuro ou até mesmo o espaço sideral. O nada é o nada, e sempre será assim. Quando descobrirem realmente o que eu sou, eu deixarei de ser o nada porque passarei a ser chamado pelo nome que me colocarem. O nada não é nada! Por enquanto...
- Sabe senhor nada? Eu tenho que pular de lá de cima e eu tenho pressa. Você poderia abrir a porta para eu sair?
- Você vai pular lá de cima?
- Vou
- Porque?
- Porque se eu pular lá de baixo eu não posso me estraçalhar lá em cima, entendeu?
- Me responde só mais uma coisa. O que você ganha com isso?
- Nada. Agora me responde você só mais uma coisa, o que você quis que eu entendesse dessa nossa conversa toda?
- Nada – respondeu-lhe o nada.
A porta se abriu e Vítor saiu rapidamente, ele estava bravo mas desta vez era com o nada!
Ao perceber a fúria de Vítor, a escada, que não podia ficar de bico fechado, logo perguntou:
- Aprendeu muita coisa com esse papo que você teve agora pouco?
- Nada!
- Nada é nada, tudo tem de ser alguma coisa.
Esse pequeno diálogo fez com que Vítor ficasse mais bravo. Claro, tudo era proposital, a escada estava irritando-o para que no andar superior ele pudesse aprender algo que, por mais ridículo que fosse, o fizesse esquecer do ocorrido que o levara estar ali naquele momento. Esse era um dos objetivos da escada.